segunda-feira, 23 de março de 2015

Capítulo 4 – A primeira impressão é a que fica

- Gente, parece que eu não dormi naaaaada...

- Mas você não dormiu mesmo! Pensa que eu não sei que você ficou lá embaixo se pegando com o Caio?

- Ué gente, eu também tinha que aproveitar a festa, né? A Gabi já tinha se dado super bem com o bonitão do Edu, não queria ficar para trás!

- Rá! Isso porque você não viu o que eu vi! Gabi ganhou massagem do garoto novo!

- Como assim, Brasil? Gabi, pode ir me contando tudo!

- Ahhh gente, depois eu conto! Estou morrendo de sono – virei para o lado, puxando o lençol para cobrir a cabeça. Eu não havia conseguido pregar o olho a noite inteira. Ou melhor, a madrugada e boa parte da manhã, já que a festa se estendeu até as três da madrugada para mim, até as quatro e meia para a Mari e para a Carol... bom, acho que ela entrou no quarto com o dia já claro.

Estava exaustava fisicamente por causa dos ensaios, mas minha cabeça se recusava a me deixar dormir. A apresentação que seria ali duas semanas não saía da minha cabeça. Além disso, logo em seguida as aulas recomeçariam e, junto com elas, também vinham as decisões que precisaria fazer até o fim daquele ano. Isso sem falar no Edu, claro.

 Eu ficava repetindo a nossa conversa mentalmente, procurando por novos detalhes, tentando registrar cada detalhe na minha memória para nunca mais esquecer. Não havia como fugir: nosso primeiro encontro havia mexido comigo e seria difícil apagar essa primeira impressão que o carioca deixara.

- Nem pensar, dona Gabriela! Eu quero saber, e quero agora... – Carol disse, pulando da sua cama para o meu colchão de ar e fazendo o maior estardalhaço no quarto. Levantei com tudo, assustada com o barulho e acabei me enrolando com o lençol, o que fez minhas duas amigas caírem na risada.

- Caramba! Acho o primo do Alê fez alguma coisa com a Gabi! Olha isso! A menina não está bem – a Cá provocou com as mãos na barriga de tanto rir.

- O que rolou além daquela massagem, hein Gabriela? Quero saber! – Mari voltou a questionar, respirando fundo para conseguir voltar ao normal.

- Nada demais, gente. Ele me ouviu comentando com o Alê sobre a apresentação e de como minha mãe ficaria brava se eu me machucasse... Acho que o Edu ficou com a consciência pesada por ter esbarrado em mim e por isso quis tentar ajudar – expliquei a contragosto.

- E foi só isso mesmo?  - Marília insistiu, dessa vez séria.

Hesitei por um momento. Eu até queria contar sobre a nossa conversa e todas as indiretas que ele soltou. Por exemplo: será que eu havia entendido certo aquele lance do Romeu? Ou será que era só uma brincadeira para descontrair? Mesmo com todas aquelas dúvidas na minha cabeça, achei melhor não tocar no assunto. Ainda era muito cedo para chegar a qualquer conclusão – Claro que foi! Acabamos de conhecer o rapaz, o que esperava que eu fizesse? Que pulasse no pescoço dele? – falei, sendo um pouco mais dramática do que gostaria.

- Ahhh Gabi, como vamos saber? Nunca vimos você assim... “apaixonadinha” por alguém – Carol mexeu as mãos querendo fazer um “entre aspas” com os dedos – Você sempre foi tão de boa com os garotos, nunca ligou para ninguém...

- Mas não estou “apaixonadinha” – imitei o seu gesto com a expressão fechada.

- Ahhh, não era o que a sua cara dizia quando entraram na festa juntos, não é Mari? – ela rebateu.

- Verdade, Gabs. Não há como negar: você ficou impressionada com o garoto – Marília disse, ganhando um sorriso de aprovação da Carol – Mas acho bom mesmo você não se apaixonar por ele.

- Mas por quê? Formaram um casal tão bonito... – a Carol perguntou, surpresa.

- Porque o Alê me disse que o primo não está afim de se apegar a ninguém agora. Que ele quer curtir, conhecer a cidade, fazer amigos, aproveitar um pouco, entende? O garoto está na pista, mas não é para negócio – Mari explicou se ajeitando melhor no colchão.

- Ahhh, mas ele disse isso antes de conhecer a Gabi – foi a vez da Carolina opinar – Além do mais, é completamente possível fazer tudo isso namorando...

- Claro que não! Ter namorado sempre empata tudo... – a outra enfatizou.

- Gente, gente... Vamos voltar à realidade, por favor? – estalei os dedos para chamar a atenção delas – o Edu é livre para fazer o que quiser, assim como eu também sou, ok? E nós não temos nada um com o outro. Foi só uma conversa...

- E uma massagem – Carol interrompeu.

- Ok, teve a massagem. Mas foi só isso. Nem sei se voltaremos a nos falar. Não peguei o Whats dele, nem nada... – completei ajeitando meus cabelos em um coque. Minha situação não poderia ser mais deplorável: franja bagunçada, olhos vermelhos de sono, corpo dolorido por conta dos ensaios, maquiagem borrada... Carol estava com uma aparência melhor: seus longos cabelos castanhos estavam presos em uma trança improvisada, seu rosto limpo de maquiagem e os grandes olhos pretos, que pareciam duas jabuticabas, atentos, dançavam de um lado para o outro. Das três, ela era a mais “menininha”. Ela gostava de se arrumar, de usar rosa, de combinar roupa e sempre sonhou com o príncipe encantado. Aquele cara para casar e viver o resto da vida juntos, até envelhecer.

Já a Marília era completamente diferente. Loira, alta, dona de impressionantes olhos azuis. Ela chamava a atenção e sabia disso. Das três, era sempre a mais assediada pelos meninos. Descolada, era muito popular no colégio e a principal razão do nosso trio fazer tanto sucesso. A Mari era cara de pau, falava com todo mundo e fazia amizades rapidamente. O tipo de pessoa que cativava a todos.

Sempre me identifiquei mais com a minha Caramelo, como gostava de chamar a Cá. Talvez porque ambas tínhamos um lado mais tranquilo e discreto... Nossas opiniões geralmente batiam e dividíamos os mesmos gostos musicais e literários. Por outro lado, a Marília trazia para a minha vida uma energia diferente... Ela conseguia despertar uma Gabi mais festeira, que se importava menos com os problemas, que tinha coragem para fugir um pouco das imposições da mãe.

Talvez fosse por isso que me dava tão bem com elas. As duas me ajudavam a manter o equilíbrio. E com a vida que eu levava, isso era algo muito, mas muito importante. Eu não tinha ideia de como sobreviveria sem aquela dupla por perto.

- Tudo bem, então. Vamos encerrar esse assunto e voltar à realidade – a Cá decretou, ficando de pé com um pulo – O que me lembra que temos um Gueto para limpar, meninas!

Respirei aliviada por me ver livre daquele assunto. Depois do que a Mari falou, tudo ficou ainda mais confuso na minha cabeça. Com muita dificuldade, consegui sair do meu colchão e ir para o banheiro me arrumar. O sol brilhava com força no céu e fazia um calor sufocante, típico da nossa cidade. Eu sentia como se tudo ao meu redor estivesse rodando, e aquilo nada tinha a ver com ressaca. Era muita informação para pouco eu.

Depois de um café rápido, começamos a organização. E por mais que eu adorasse as festas no Gueto, eu sempre odiava o dia seguinte. Era incrível como conseguíamos fazer tanta bagunça em apenas uma noite!

Mas era como dizia o velho ditado: tudo que é bom dura pouco. Logo, o jeito era encarar a arrumação. Pelo menos aquilo me ajudaria a ficar longe dos meus outros problemas.

***

Os pais da Carol voltaram no final da noite. Geralmente eles ficavam na casa da praia durante todo o final de semana e só voltavam na segunda bem cedo. Porém, dessa vez eles tinham um aniversário para ir, por isso precisaram subir a serra mais cedo.

Com a Cá sã e salva com sua família, aproveitei que o irmão mais velho da Mari foi buscá-la para pegar uma carona até o meu condomínio. Como morava perto da portaria, desci por ali mesmo para evitar o trabalho que eles teriam de preencher um cadastro para entrar. O Alpes, onde eu morava, era o condomínio mais caro e chique da cidade e, por isso, tinha um monte de regras de segurança para visitantes. Essa parte era bem chata, mas de resto era tranquilo morar ali. Essa era uma das poucas coisas que meu pai havia contribuído para a minha vida. Como era um importante empresário que morava em Nova York, nós não tínhamos muito contato. Tudo o que sabia era que ele trabalhava como um louco e que pagava uma generosa pensão para minha mãe. E era toda essa “generosidade” que mantinha alguns dos nossos confortos, como a casa e o carro. Aquilo era o máximo de “pai presente” que tive durante toda a minha vida, incluindo algumas ligações no Natal e aniversário.

Era estranho, mas fazer aquele caminho para casa sempre me fazia pensar no quanto minha vida poderia ser diferente se morasse com ele. Houve uma época que eu temia que isso pudesse acontecer, que ele chegasse a pedir a minha guarda ou coisa parecida, mas já fazia um tempo que eu torcia para que isso, de fato, virasse realidade. Sei lá, só queria que uma mágica ocorresse e PUF! Tudo mudasse...

- Heeey Gabs! – ouvi alguém me chamar.

Virei o rosto, na direção de onde vinha a voz e vi o Alê e o Edu vindo de skate, um pouco mais atrás de mim. Estávamos na avenida principal do condomínio, que circundava o lago localizado no centro do residencial. Já era quase e sete e meia da noite, mas como era no horário de verão, o sol ainda estava se pondo. Raios dourados iluminavam as águas escuras do lago e a copa das árvores que margeavam a avenida, tingindo o cenário com uma luz especial.

- Heeey! Estão dando um rolê? – perguntei enquanto esperava que se aproximassem.

- Estou vendo se o Edu é mesmo tão bom no skate como ele diz – Alê disse quando chegou até mim, estendendo a mão na sequência para tocar na minha mão.

- Não disse que era bom no skate. Disse que sabia fazer algumas manobras, e só... Meu negócio mesmo são as ondas – Edu se defendeu – E aí, Julieta? Procurando seu Romeu? – disse ao se aproximar para me cumprimentar com dois beijos no rosto, o que me fez ficar um pouco perdida novamente.

- Mas não era Rapunzel?

- Alexandre! – coloquei a mão na cintura, irritada.

- Brincadeira, brincadeira! Eu sei que a apresentação será de Romeu e Julieta no Teatro Municipal no dia do encerramento do Festival de Verão. A orquestra da cidade vai tocar as músicas para vocês não, é? – ele se justificou enquanto deslizava no seu skate fazendo pequenas manobras. Edu e eu caminhávamos ao seu lado, sem pressa.

- Nossa, vai rolar até orquestra? Caramba, o negócio será grande, hein? – o loiro pareceu impressionado.

- Sim! Como te disse, minha mãe faz parte da organização e desde o início eles queriam algo grandioso. A ideia é inscrever a participação em grandes festivais, como o de Campos do Jordão e circuitos em São Paulo – expliquei – Por isso estou me dedicando tanto aos ensaios. Vai ser ótimo ter uma produção desse porte no meu currículo...

- E você já sabe o que vai fazer? Se vai mesmo estudar balé clássico? – Alê quis saber.

- Não... Continuo mais perdida do que antes. Sei lá... andei pensando em dar um tempo e fazer um intercâmbio enquanto não escolho entre faculdade ou escola de dança. Pelo menos posso aperfeiçoar meu inglês – contei ao virar a esquina da nossa rua.

- Seria uma boa, Gabs. Mas será que sua mãe concordaria? Você disse que ela está te cobrando entre as duas primeiras opções – Alê opinou, ainda deslizando em seu skate.

- Na verdade, ela quer mesmo a escola de dança. A faculdade fui eu quem sugeriu – estiquei a mão para pegar o boné que estava na sua cabeça e vesti-lo. Eu adorava fazer isso só para ver o cabelo do Alê bagunçado. Ele era do tipo que usava os fios mais compridinhos na parte de trás. Assim, com o acessório, ficava superbacana e descolado. Mas quando tirávamos o boné...

- Ahhh não, Gabi! Não faz isso! – ele protestou.

- Precisa pentear esse cabelo, menino! Olha isso! Parece um ninho – baguncei ainda mais seus fios, rindo alto.

- Vai Gabs, devolve aqui. Preciso entrar! Combinamos de ajudar minha tia com algumas coisas na casa nova, não é Edu? – ele pediu fazendo cara de emburrado.

- É sim! Ela está querendo agilizar a mudança, mas tem alguns detalhes que precisamos resolver antes. Tipo colocar algumas prateleiras, arrumar portas, nada demais – o carioca se justificou. Eu ainda não havia me acostumado com o seu sotaque carregado e achava engraçado ouvi-lo falando.

- Uaaau, que garotos prendados! Sendo assim, vou para casa para não atrapalhar essa organização familiar – zombei, tirando o boné e devolvendo para o dono.

- Valeu, Gabi – ele agradeceu recolocando a peça na cabeça – E é sério, preciso mesmo ir nessa. Depois a gente se fala mais, beleza?

- Beleza, vai lá! E boa sorte na organização. Espero que dê tudo certo – me despedi com um beijo no rosto e um rápido abraço – Tchau, Edu... – virei na direção do loiro para me despedir, mas ele me impediu.

- Te acompanho até sua casa. É nessa mesma rua, não é?

- Sim, é aquela ali – apontei para o sobrado com janelas espelhadas e cortinas claras – Mas não precisa, sério.

- Relaxa, só quero saber como está o seu pé – ele mexeu nos cabelos, meio sem jeito. Estava óbvio que ele queria saber sobre qualquer coisa, menos sobre a situação do meu pé. Tão óbvio que o Alê se apressou para entrar, murmurando alguma coisa sobre procurar uma chave de fenda, tudo para nos deixar a sós o mais rápido possível.

De repente ficamos sozinhos, a não ser pelo silêncio chato que tomou conta da situação. Com um gesto rápido, ele apontou o caminho e então voltamos a caminhar, um ao lado do outro.

- E o seu pé? – ele puxou assunto.

- Está ótimo. Não senti nada hoje pela manhã – contei.

- Falei que minha massagem funcionava...

- É, acho que preciso mesmo agradecer – dei um meio sorriso, olhando-o de lado.

- Acho que o mínimo que mereço é um convite para assistir a apresentação – ele provocou.

Balancei a cabeça como se estivesse analisando a questão – Me parece justo... E de qualquer forma, preciso de pessoas conhecidas na primeira fila para me aplaudir, caso ninguém mais o faça... – emendei, parando em frente à minha casa.

- Se você dançar fazendo essa carinha de cachorro sem dono, duvido que alguém vá resistir. Todo mundo vai aplaudir, nem que seja de pena – ele parou de frente para mim, um pouco perto de mais para que eu conseguisse desviar o foco daqueles olhos verdes tão intensos.

- Poxa, esse foi um incentivo e tanto... Se já estava com medo antes, agora então... – caprichei ainda mais na minha expressão de “garotinha indefesa”, só para provocá-lo.

- Não, calma! Não foi isso que eu quis dizer... – meu plano deu certo, porque ele mexia as mãos, nervoso. Segurei firme a minha cara de triste, agradecendo mentalmente às aulas de interpretação que fiz.

- Olha, o que quis dizer é que independente do que faça no palco, as pessoas vão aplaudir de qualquer jeito. Porque é preciso muita coragem para encarar uma plateia disposta a fazer o seu melhor – ele colocou uma das suas mãos no meu ombro, fazendo meu corpo estremecer de leve – E eu sei que você será a Julieta mais linda que já existiu. Sorte de quem estiver lá para te assistir – ele encostou a ponta dos dedos na minha bochecha, acariciando levemente.

Fechei os olhos e me concentrei em apenas sentir. Primeiro o cheiro de roupa limpa que vinha dele, depois o suave toque dos seus lábios passando pelos meus, o meu coração disparado dentro do peito, sua outra mão na minha cintura até que, por fim, ele me beijou.

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Notas finais: Geeeeeenteeeee, rolou beijo! Como assim, Braseeeeel?

A pergunta que não quer calar: Edu está afim da Gabi? Porque a Gabs está muito caidinha por ele, né?

E depois desse beijo, como serão as coisas? Contem o que acharam, ok?

Beijocas e ótima semana para todos!


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terça-feira, 17 de março de 2015

Capítulo 3 – Começando com o pé direito

Sabe aqueles filmes que retratam a formatura de jovens americanos? Geralmente não rola aquele momento quando alguém importante/inesperado/extremamente bonito chega e a festa para? Foi exatamente assim que me senti.

Uma música eletrônica animava o ambiente e conversas enchiam o ar de alegria quando o Alê apareceu segurando os copos de dose, seguido por mim pendurada no mais novo deus grego do pedaço. Edu, por sua vez, não deixava por menos: um de seus braços estava ao redor da minha cintura enquanto a sua mão livre segurava a minha em um gesto que demonstrava carinho e preocupação.

"Caramba!", era tudo o que se passava pela minha cabeça.

Claro que todos os olhares da festa foram atraídos pela nossa entrada triunfal. Vi uma reação diferente no rosto de cada garota. Naty, Mel e Deby mal conseguiam disfarçar o recalque. Carol me encarava com uma expressão divertida, como se quisesse entender de onde havia brotado aquele rapaz e como eu fui parar naquela situação. Já a Mari arregalou os olhos e fez cara de espanto.

- Pessoal, esse é o meu primo Edu. Ele veio do Rio e ainda está se adaptando à rotina caipira e parada de Guará City - Alê informou. Mal sabia ele que apresentações não eram necessárias... O Edu era o convidado especial da festa naquela noite.

Foi só aí que me dei conta dessa informação! O nosso esbarrão foi tão impactante que mal me dei conta que ele falara que era carioca. Bom, isso explicava a pele queimada de sol e o jeito descolado... Mas como um rato de praia ia se virar em uma cidade como Guararema? Nosso município ficava no interior do estado de São Paulo e era o exemplo da típica cidade pequena: todo mundo conhecia todo mundo, tinha uma praça, uma rua que subia, outra que descia e... só. O único atrativo eram os eventos organizados para atrair turistas, como o Festival de Verão que oferecia apresentações culturais gratuitas. Inclusive, eu fazia parte do elenco do balé que encerraria o festival naquele ano.

- Aláa a Gabi! Já partiu pra cima do garoto! Não perde tempo mesmo, hein? – o Caio não deixou passar a oportunidade de zoar com a minha cara.

- Não é nada disso, seu idiota! – às vezes eu achava o jeito de “sabe tudo” daquele garoto extremamente irritante – Eu torci meu pé. Edu está apenas me ajudando – expliquei me soltando do rapaz e fazendo esforço para me endireitar sem precisar de ajuda.

- Uaauu! Então quer dizer que você é do tipo que salva donzelas indefesas? Perfeito para a nossa bonequinha Gabi – a Carol provocou. Qual era a daquele casal, hein? Estavam armando um complô contra mim?

Com um olhar rápido, percebi que o Edu mexia nos cabelos, tão sem jeito quanto eu.

- Os copos que você me pediu estão com o Alê, Carol – avisei, mesmo sabendo que ela já tinha visto – E o Caio não estava afim de jogar truco? – mudei de assunto, propositalmente.

- Estou só esperando quem serão as minhas próximas vítimas – ele não perdeu a chance de mostrar que era “o tal”.

- Ai, ai... vamos mostrar para ele quem manda aqui, parceira? – Alê perguntou com uma expressão desafiadora no rosto ao mesmo tempo que me oferecia a mão, como se quisesse me conduzir até a mesa de jogo.

- Será um prazer – Ele não fazia ideia do quanto eu realmente queria colocar aquele menino no seu devido lugar.

- Carol, você vem? – Caio gritou chamando a parceira de jogo-barra-ficante.

- Ahhh, não estou afim agora não. Estou aqui conversando com as meninas... – ela dispensou apontando para a rodinha de meninas que havia se formado. Eu tinha quase certeza que o assunto era o garoto novo – E ainda teremos porradinha! – ela pegou os copos da mão do nosso amigo com um sorriso satisfeito nos lábios.

- Posso jogar? – falando em Edu, ele se ofereceu para ser o substituto.

- Pode ser... – o Caio deu de ombros, sem se importar.

- Gente, fico de próxima, ok? Se alguém desistir, eu entro! – Mari pediu. Eu estava achando estranho que ela ainda não estava participando da conversa... Considerando que não tirou o olho do Edu desde que ele chegou, achei que “atacaria” mais rápido.

Alê gritou algo em resposta e caminhamos até a mesa de jogos – que na verdade eram quatro cadeiras de alumínio, no estilo daquelas de bar, com uma bobina de madeira deitada no centro – e me posicionei na frente dele. Caio foi buscar cervejas para nós enquanto Edu embaralhava as cartas.

- Corta e tira a manilha, por favor – o surfista pediu. Revirei os olhos quando percebi que estava fazendo movimentos extravagantes só para se mostrar.

- O cinco manda no jogo – Declarei em tom sério ao virar a carta número quatro. Mantive a minha expressão séria e concentrada, mas percebi pelo canto do olho que o Edu estava muito bravo. O motivo era um truque que eu usara para quebrar o esquema de cartas que ele organizou enquanto embaralhava o baralho. Na minha frente, Alê tentava disfarçar o riso, fingindo não perceber a frustação do primo.

O truco não é um jogo difícil. Tudo o que uma pessoa precisa ter para jogar é um baralho sem os números 8,9,10 (de todos os naipes) e o curinga. A parte complicadinha é decorar quais cartas são as mais fortes. Por exemplo, a três é mais “poderosa” de todas, depois vem o 2, A, K,J,Q,7,6,5 e 4. Porém, ainda há as manilhas, que servem como, digamos, o “elemento surpresa”. Sempre antes de começar o jogo, uma carta é retirada do baralho virada para cima. A carta seguinte será considerada a mais forte e mandará na partida. Como tirei o número 4 ao cortar o baralho, o cinco seria o “manda chuva” da rodada (ou da mão, como se diz no truco).

Para completar essa parte da manilha, ainda há os naipes. O mais “bam bam bam” de todos era o Paus, ou Zap, como é conhecido entre os “truqueiros”. Depois vem o Copas (Escopeta), Espadas (Espadilha) e Ouro (Pica Fumo).

Ok, talvez não seja assim tão simples, mas o fato de cada jogador receber apenas três cartas acaba facilitando um pouco. Fica mais fácil raciocinar sem ter as mãos cheias...

- Certo, hora do show. Pronta, parceira? – Alê perguntou depois que Edu distribuiu as cartas. A expressão do carioca continuava séria.

- Sempre pronta – Concordei enquanto verificava as minhas cartas e chegava à conclusão que aquela era a minha noite de sorte. Além de um três espadilha, estava com um cinco de paus. Provavelmente aquelas eram as cartas que o Edu havia preparado para o parceiro enquanto embaralhava, mas com a minha interferência na hora do corte acabaram parando nas minhas mãos.

Mexi nos cabelos, enrolando os fios e colocando-os no meu ombro direito. Aquele era um gesto que eu e Alê já havíamos combinado. Significava que eu estava com a mão boa e iria pedir truco.

No jogo, uma partida normal vale apenas um ponto. Porém, quando se pede “truco”, ela passa a valer três. Em casos muitos especiais, quando alguém está com muita sorte e sai com a mão perfeita, a aposta pode aumentar para seis e até 12 – pontuação máxima, quando as duplas são trocadas ou o placar é zerado.

- Poxa parceira, a coisa está russa aqui – Alê fez um drama, querendo valorizar a partida. Eu sabia que ele realmente não estava com cartas boas, porque já havia passado a língua pelos lábios – um outro sinal que costumávamos usar.

- É, acho que seu primo nos pegou. Ele deve ter táticas cariocas que ainda não conhecemos – entrei na onda de lamentação só para fazer charme. Afinal, a grande graça do truco não estava no jogo em si, mas sim no blefe e nos “macetes” que aprendíamos para ficarmos com as melhores cartas. Assim como o poker, o truco é um jogo no qual você sabe que o adversário vai trapacear. O seu papel é cumprir essa tarefa melhor do que ele.

- Ué, o que aconteceu com toda a marra de vocês? – Caio provocou, seu ego inflando cada vez mais de tamanho.

- Só porque você tocou no assunto – Edu puxou uma de suas cartas e a apontou para mim – vou começar mostrando todo meu poder carioca – ele completou lançando um três de copas na mesa.

- Uaaauuu! Isso que eu chamo de começar com o pé direito – comentei lançando a minha carta mais fraca: um quatro pica fumo.

 - Vou deixar você fazer essa rodada, parceiro – Caio avisou fazendo a sua jogada.

  - É... serei obrigado a deixar o Edu ganhar essa – o skatista jogou um sete na mesa – Mas não se preocupa, Gabi. É sorte de principiante. Já, já, passa...

  - Sorte de principiante, é? – o loiro questionou pegando as cartas que jogamos e as colocando embaixo do monte – Então segura essa aqui – ele jogou um cinco escopeta na mesa – E eu quero truco! – gritou na sequência, chamando a atenção de todos – E aí, Gabriela? Vai encarar?

Do meu lado, o Caio gritava palavras de incentivo para o parceiro enquanto eu e o Alê esperávamos em silêncio.

- E aí, encara ou não, bonequinha? – ele voltou a provocar depois de bater na mesa em um gesto intimidador.

- Parceiro, o que você acha? – perguntei com a voz calma, tentando demonstrar o mínimo possível as minhas intenções.

- Olha parceira, acho que você deveria mostrar para ele quem é a bonequinha aqui – ele respondeu de forma sarcástica.

- Achei essa uma ótima ideia – sorri de forma irônica olhando feliz da vida para a minha manilha. Aquela rodada estava no papo – Se é para trucar, então vamos fazer isso direito. Eu quero seis!

- Você ouviu o que ela disse? Ela pediu seis, rapaz! SEEEEEEIIIIIIIIS! Segura essa agora, Eduardo – Alê bateu na mesa, provocando os adversários. O resto do pessoal que estava na festa acabou entrando no clima e gritando frases de incentivo para nós.

Fixei meu olhar no do Edu esperando por sua resposta. Eu sabia que ele estava sem saída e aquilo me fez sentir poderosa. Era algo inexplicável, mas aqueles olhos verdes pareciam estar permanentemente me desafiando, me tirando do meu lugar comum. De repente, provar que eu era muito mais do que ele imaginava se transformou no objetivo daquela partida.

- Estou pagando para ver – foi tudo o que ele disse, fazendo cara de quem estava menosprezando a minha carta.

Quando lancei minha manilha sobre a mesa vi o loiro arregalar os olhos e balançar a cabeça enquanto o Alê comemorava fazendo muito barulho.

- Quem é a bonequinha agora? – questionei me sentindo a tal.

Ele não respondeu. Ao invés disso, pegou seu copo de cerveja e deu um longo gole, os olhos cravados em mim.

Dali em diante o jogo pegou fogo. Meu parceiro estava em um dia inspirado e eu, como já havia percebido, com sorte. O resultado disso foi que chegamos à pontuação máxima vencendo mais duas partidas enquanto nossos adversários conseguiram somar apenas quatro pontos com uma vitória e um empate.

- Podem vir os próximos que esses daqui já são fregueses – Alê comemorou, empolgado.

- Hããnnn, parceiro – chamei com a voz baixa – Se importa se eu não jogar a próxima? – discretamente, desviei o olhar para baixo da mesa.

Graças aos céus, ele foi inteligente o suficiente para perceber o que queria dizer. Meu pé estava doendo. Não era nenhuma dor insuportável, mas com a apresentação se aproximando, eu não poderia me dar ao luxo de ficar machucada. Minha mãe jamais me perdoaria por isso.

- Está tudo bem? – ele quis saber.

- Sim, sim... Vai melhorar – tentei parecer otimista.

Por sorte, ninguém reparou no nosso diálogo. A festa estava bombando com som alto e muitas conversas. Pelo que entendi, Natália e Mel queriam aprender a jogar truco e estavam tentando organizar as duplas e os professores para ajudá-las.

Aproveitei o momento de animação para sair de mesa e ir até a cozinha. O cômodo estava escuro, mas a luz que vinha do Gueto fornecia iluminação o suficiente para que eu pudesse enxergar onde estava indo. Como frequentava a casa há muito tempo já sabia onde tudo estava guardado. Por isso não foi difícil pegar o gelo no congelador e enrolá-lo em um pano de prato. Sentei em uma cadeira, tirei o sapato e apliquei a compressa no lugar machucado, rezando para que não fosse nada demais.

- Está inchado? – quase cai da cadeira quando ouvi alguém perguntar.

Virei o rosto na direção da porta e lá estava ele. Os olhos brilhando perigosamente na minha direção.

- Não, só está doendo um pouco. Não é nada demais, mas não quero correr o risco – minimizei o problema. Não queria fazer um drama logo no primeiro encontro.

- Que zica isso! Daqui, deixa eu te ajudar – disse, caminhando em minha direção, puxando uma cadeira e sentando-se na minha frente. Com um gesto firme e decidido, puxou a minha perna e a pousou no seu joelho. Depois passou a examinar o meu tornozelo.

Fiquei parada, com o gelo na mão, assistindo a cena sem ter reação. Ou aquele era realmente o meu dia de sorte, ou lá no Rio as pessoas tinham um jeito muito mais direto de fazer amizades.

- É, não está inchado mesmo – ele concluiu – Onde doi? – ele passou a apertar meu tornozelo em diferentes pontos e por um momento fiquei tão deliciada com seu toque na minha pele que até esqueci da dor.

- Aí, aí... Nesse ponto – avisei quando ele desceu a mão pela lateral do meu pé – Perto desse ossinho.

- Beleza! Tenho certeza que depois dessa massagem passa – o surfista avisou concentrado em sua tarefa.

Fiquei ali, com a perna esticada, com o pé entre as mãos de um garoto que eu acabara de conhecer e, coincidentemente, era a razão do meu pé estar ferrado. Era isso o que as pessoas queriam dizer quando falavam a velha frase “a vida é uma caixinha de surpresas”?

- A boneca perdeu a fala? – Voltei à realidade com o loiro estalando os dedos na minha frente de forma provocativa.

- O que você disse? – fiz cara de brava. A verdade é que não sabia o que deveria sentir: raiva por ele me provocar? Medo por mexer tanto comigo? Entusiasmo por, enfim, a mudança que tanto queria finalmente chegar?

- Perguntei que apresentação é essa que você vai fazer... – ele revirou os olhos, impaciente por ter que repetir. Mas que garoto petulante!

- Será uma apresentação de Romeu e Julieta

- Então você é bailarina e atriz? – sua cara de dúvida me fez rir.

- Não, não... Será uma apresentação de dança, só que contando a história do clássico. Isso é o que chamamos de ballet de repertório – expliquei de modo resumido.

- E qual é o seu papel na peça, ou ballet, sei lá...? – Edu gesticulou com a mão demonstrando que estava confuso.

- É um ballet, só que de repertório... – repeti para que entendesse - E eu faço a Julieta.

- Uaaauuu! Então você é a donzela que arrisca tudo por amor? – claro que ele tirou sarro.

- Não, esse é apenas o papel que represento no palco – foi a minha vez de revirar os olhos.

- E qual é o papel que você representa na vida real? – pela expressão centrada, deu para perceber que ele não estava brincando.

- Eu não represento um papel... – retruquei na hora.

- E por que todo mundo te chama de bonequinha de porcelana? – senti uma pausa na massagem. Droga! Ele estava mesmo querendo saber.

- Haamm... Acho que é porque eu sempre dancei ballet a minha vida inteira, ou porque tenho uma mãe muito rigorosa que pega muito no meu pé... Também tem a minha aparência que ajuda bastante, né? – mexi nos cabelos meio nervosa, trocando a compressa de gelo de mãos – Ser branca que nem um fantasma ou como porcelana, como costumam dizer.... E sei lá... Acho que tudo contribui para isso, afinal. Minha vida sempre seguiu um rumo tranquilo, sem muitas curvas... Acho que por isso que sou assim... – acabei desabafando, indo muito além do que queria expor.

- A Julieta perfeita – ele deu um meio sorriso, e fiquei sem saber se aquilo era algo bom ou ruim – E por que sua mãe vai te matar se você se machucar? – meu pé voltou a ser massageado enquanto emendava outra questão.

- Isso é um interrogatório? – cruzei os braços fazendo birra. O gelo começava a derreter, mas não me importei com aquilo.

- Não, só quero saber mais sobre a Julieta. Vai que a vaga de Romeu está disponível... – Edu deu ombros, como se estivesse falando algo totalmente corriqueiro.

Foquei em seus olhos verdes, procurando por algum resquício de ironia, ou brincadeira. Não achei. Me remexi na cadeira, inquieta. O que aquilo significava?

- Minha mãe é coreógrafa da peça. Ela é professora de dança clássica e foi bailarina por muitos anos. Só interrompeu a carreira porque ficou grávida de mim – expliquei, olhando para baixo, sem coragem de encará-lo.

- Então você faz ballet por causa da sua mãe? – as perguntas continuavam.

- Sim e não... Mas isso é uma longa história – desconversei. Aquela era uma questão que me incomodava já há algum tempo. Por isso, era melhor fugir dela, pelo menos até que eu pudesse encontrar a resposta... – Mas e você? Estou curiosa para saber como veio parar na nossa cidade.

- Bom, como você já sabe, sou primo do Alê e morava no Rio. Como meus pais são bancários, nós já mudamos de cidade muitas vezes, geralmente por causa do trabalho dos dois. Mas dessa vez o motivo é meu irmão. Ele passou para medicina na USP e, como minha mãe não quer ficar longe dele, deu um jeito de pedir transferência para cá já que a cidade fica mais perto de São Paulo. Eu e ela viemos primeiro para resolver as questões do meu colégio, da casa e do trampo dela. Meu pai chega depois. Meu irmão vai direto para São Paulo cuidar do apartamento, ou melhor, “apertamento” que ele alugou perto do campus. A ideia é ele vir nos visitar aos finais de semana – ele explicou apertando meu pé de maneira tão suave que eu mal sentia seus dedos.

- E você vai morar no nosso condomínio?

- Não. Estamos hospedados na casa do Alê por enquanto, mas é só até a nossa ficar pronta. Pelo o que entendi, vou morar nesse bairro aqui. É Itapema o nome, né? – concordei com a cabeça – Você também mora no condomínio onde fica a casa da minha tia?

- Sim, na mesma rua, inclusive – disse.

- Seremos vizinhos temporários, então? – ele abriu um sorriso provocante.

- É o que parece... – foi tudo o que consegui dizer depois de recuperar o fôlego.

- Essas marcas no seu pé são por causa do ballet? – o surfista passou a encarar as bolhas e calos que existiam ali, principalmente na região dos meus dedos.

Sentindo o rosto arder de tanta vergonha, apenas gesticulei com a cabeça dizendo que sim. Eu nunca gostava de mostrar os meus pés por conta das marcas que horas e horas de ensaio e esforço me causavam. A verdade é que todo mundo julga uma bailarina como um ser lindo, leve, ágil e até mesmo frágil, mas para alcançar tal patamar nossos pés sofriam muito dentro das sapatilhas e todo nosso corpo era constantemente exigido durante as aulas.

- Caramba! Quantas horas você ensaia por dia? – ele olhava cada marca como se fosse algo precioso, e não cicatrizes feias e disformes. Aquilo me tocou porque eu mesma, em alguns momentos, não conseguia encará-las daquela maneira.

- Depende... Para essa peça ensaiamos duas horas por dia em ritmo bem puxado. Também tivemos aulas de interpretação para ajudar na construção das cenas – expliquei – Mas dependendo do dia, eu chego em casa e ainda continuo praticando. Minha mãe sempre diz que é a prática que leva a perfeição.

- Nossa, tenho certeza que você ama muito o que faz. Senão não suportaria toda essa pressão, nem que fosse só para agradar sua mãe – ele concluiu, agora mais preocupado em analisar o meu pé do que massageá-lo.

- Ai Gabi, finalmente achei você! Veeeem! O Alê está te chamando para jogar... – a Mari entrou distraída na sala segurando um copo nas mãos. Pelo seu nível de “felicidade”, eu poderia apostar que ela estava bebendo vodka ou participando da rodada de porradinha. Porém, ao ver a cena, sua voz falhou e seus olhos ficaram arregalados como se não pudesse acreditar no que estava acontecendo – ...a próxima rodada – minha amiga precisou fazer um tremendo esforço para se recuperar e terminar a frase.

- Hãã... O Edu estava só me ajudando, porque meu pé ainda estava doendo. Você lembra, né? A gente esbarrou um no outro quando ele chegou e eu acabei torcendo o tornozelo – corri me explicar, ao mesmo tempo que puxava o meu pé, o enfiava dentro do sapato e ficava em pé, tudo em menos de cinco segundos. Eu nem lembrava se havia mesmo falado sobre o encontrão, mas agora isso não importava. Eu só queria justificar aquela situação de tamanha intimidade com alguém que eu acabara de conhecer.

- Pois é... Eu não quero ser o responsável por prejudicar a Julieta. Os Capuletos podem passar a me odiar como fazem com os Montecchios... – ele fez graça, mas pelo jeito que mexia no cabelo dava para perceber que não estava à vontade com o flagra.

- Ahh, a Gabi vive fazendo drama por causa dessa peça... – Mari desdenhou querendo minimizar os meus problemas, como sempre costumava fazer. Às vezes isso era ótimo, mas naquele momento não gostei nem um pouco. Ela sabia muito bem a importância que aquela apresentação tinha para mim.

- Drama? Ensaiar duas horas por dia, ter o pé cheio de marcas e encarar um palco cheio de gente te assistindo... Pra mim isso não é fazer drama – fiquei exultante com a resposta do Edu. Caramba! Finalmente alguém que entedia que não dava para ter uma vida de adolescente normal por causa da seriedade e responsabilidade que o ballé exigia.

- Não, eu sei... Mas só uma trombada não vai zuar o pé dela. Já passamos por situações muito piores e ela conseguiu ensaiar no dia seguinte – Mari se redimiu dando um sorriso amarelo – E agora vamos! Estamos só esperando vocês para começar a rodada. Gabs vai jogar com o Alê, como sempre, e você – ela pegou a mão do Edu, puxando-o para fora da cozinha – vai jogar comigo.

Ele lançou um olhar rápido na minha direção que eu entendi como “puts, que chato” e seguiu a minha amiga que falava sobre seus talentos no truco de forma um pouco entusiasmada demais, na minha opinião.

Não tive opção se não segui-los. Coloquei a bolsa de gelo improvisada na pia e depois caminhei até o Gueto.

O restante da festa passou como um borrão para mim. Lembro de ter vencido todas as rodadas com meu parceiro, de ter bebido cerveja até ficar bem alegre e de dançar. Mas por onde quer que eu fosse, sentia o olhar dele me seguindo. E era uma sensação estranha, porque, ao mesmo tempo que me intrigava, também fazia meu coração bater como um louco.

Como era possível que tão belos olhos pudessem causar atração e medo ao mesmo tempo?
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Notas finais: Nesse capítulo deu para conhecer um pouco melhor o Edu e a Gabi, né? E aí, o que acharam? Será que o carioca está afim dela? E Gabi, será que vai cair na dele?

Só aviso que o próximo capítulo será interessante!


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