-
Gente, parece que eu não dormi naaaaada...
-
Mas você não dormiu mesmo! Pensa que eu não sei que você ficou lá embaixo se pegando
com o Caio?
-
Ué gente, eu também tinha que aproveitar a festa, né? A Gabi já tinha se dado
super bem com o bonitão do Edu, não queria ficar para trás!
-
Rá! Isso porque você não viu o que eu vi! Gabi ganhou massagem do garoto novo!
-
Como assim, Brasil? Gabi, pode ir me contando tudo!
-
Ahhh gente, depois eu conto! Estou morrendo de sono – virei para o lado, puxando
o lençol para cobrir a cabeça. Eu não havia conseguido pregar o olho a noite
inteira. Ou melhor, a madrugada e boa parte da manhã, já que a festa se
estendeu até as três da madrugada para mim, até as quatro e meia para a Mari e
para a Carol... bom, acho que ela entrou no quarto com o dia já claro.
Estava
exaustava fisicamente por causa dos ensaios, mas minha cabeça se recusava a me
deixar dormir. A apresentação que seria ali duas semanas não saía da minha
cabeça. Além disso, logo em seguida as aulas recomeçariam e, junto com elas,
também vinham as decisões que precisaria fazer até o fim daquele ano. Isso sem
falar no Edu, claro.
Eu ficava repetindo a nossa conversa
mentalmente, procurando por novos detalhes, tentando registrar cada detalhe na
minha memória para nunca mais esquecer. Não havia como fugir: nosso primeiro
encontro havia mexido comigo e seria difícil apagar essa primeira impressão que
o carioca deixara.
-
Nem pensar, dona Gabriela! Eu quero saber, e quero agora... – Carol disse,
pulando da sua cama para o meu colchão de ar e fazendo o maior estardalhaço no
quarto. Levantei com tudo, assustada com o barulho e acabei me enrolando com o
lençol, o que fez minhas duas amigas caírem na risada.
-
Caramba! Acho o primo do Alê fez alguma coisa com a Gabi! Olha isso! A menina
não está bem – a Cá provocou com as mãos na barriga de tanto rir.
-
O que rolou além daquela massagem, hein Gabriela? Quero saber! – Mari voltou a
questionar, respirando fundo para conseguir voltar ao normal.
-
Nada demais, gente. Ele me ouviu comentando com o Alê sobre a apresentação e de
como minha mãe ficaria brava se eu me machucasse... Acho que o Edu ficou com a
consciência pesada por ter esbarrado em mim e por isso quis tentar ajudar – expliquei
a contragosto.
-
E foi só isso mesmo? - Marília insistiu,
dessa vez séria.
Hesitei
por um momento. Eu até queria contar sobre a nossa conversa e todas as
indiretas que ele soltou. Por exemplo: será que eu havia entendido certo aquele
lance do Romeu? Ou será que era só uma brincadeira para descontrair? Mesmo com
todas aquelas dúvidas na minha cabeça, achei melhor não tocar no assunto. Ainda
era muito cedo para chegar a qualquer conclusão – Claro que foi! Acabamos de
conhecer o rapaz, o que esperava que eu fizesse? Que pulasse no pescoço dele? –
falei, sendo um pouco mais dramática do que gostaria.
-
Ahhh Gabi, como vamos saber? Nunca vimos você assim... “apaixonadinha” por
alguém – Carol mexeu as mãos querendo fazer um “entre aspas” com os dedos –
Você sempre foi tão de boa com os garotos, nunca ligou para ninguém...
-
Mas não estou “apaixonadinha” – imitei o seu gesto com a expressão fechada.
-
Ahhh, não era o que a sua cara dizia quando entraram na festa juntos, não é
Mari? – ela rebateu.
-
Verdade, Gabs. Não há como negar: você ficou impressionada com o garoto –
Marília disse, ganhando um sorriso de aprovação da Carol – Mas acho bom mesmo
você não se apaixonar por ele.
-
Mas por quê? Formaram um casal tão bonito... – a Carol perguntou, surpresa.
-
Porque o Alê me disse que o primo não está afim de se apegar a ninguém agora.
Que ele quer curtir, conhecer a cidade, fazer amigos, aproveitar um pouco, entende?
O garoto está na pista, mas não é para negócio – Mari explicou se ajeitando
melhor no colchão.
-
Ahhh, mas ele disse isso antes de conhecer a Gabi – foi a vez da Carolina
opinar – Além do mais, é completamente possível fazer tudo isso namorando...
-
Claro que não! Ter namorado sempre empata tudo... – a outra enfatizou.
-
Gente, gente... Vamos voltar à realidade, por favor? – estalei os dedos para
chamar a atenção delas – o Edu é livre para fazer o que quiser, assim como eu
também sou, ok? E nós não temos nada um com o outro. Foi só uma conversa...
-
E uma massagem – Carol interrompeu.
-
Ok, teve a massagem. Mas foi só isso. Nem sei se voltaremos a nos falar. Não
peguei o Whats dele, nem nada... – completei ajeitando meus cabelos em um
coque. Minha situação não poderia ser mais deplorável: franja bagunçada, olhos
vermelhos de sono, corpo dolorido por conta dos ensaios, maquiagem borrada...
Carol estava com uma aparência melhor: seus longos cabelos castanhos estavam
presos em uma trança improvisada, seu rosto limpo de maquiagem e os grandes
olhos pretos, que pareciam duas jabuticabas, atentos, dançavam de um lado para
o outro. Das três, ela era a mais “menininha”. Ela gostava de se arrumar, de
usar rosa, de combinar roupa e sempre sonhou com o príncipe encantado. Aquele
cara para casar e viver o resto da vida juntos, até envelhecer.
Já
a Marília era completamente diferente. Loira, alta, dona de impressionantes
olhos azuis. Ela chamava a atenção e sabia disso. Das três, era sempre a mais
assediada pelos meninos. Descolada, era muito popular no colégio e a principal
razão do nosso trio fazer tanto sucesso. A Mari era cara de pau, falava com
todo mundo e fazia amizades rapidamente. O tipo de pessoa que cativava a todos.
Sempre
me identifiquei mais com a minha Caramelo, como gostava de chamar a Cá. Talvez
porque ambas tínhamos um lado mais tranquilo e discreto... Nossas opiniões
geralmente batiam e dividíamos os mesmos gostos musicais e literários. Por
outro lado, a Marília trazia para a minha vida uma energia diferente... Ela
conseguia despertar uma Gabi mais festeira, que se importava menos com os
problemas, que tinha coragem para fugir um pouco das imposições da mãe.
Talvez
fosse por isso que me dava tão bem com elas. As duas me ajudavam a manter o equilíbrio.
E com a vida que eu levava, isso era algo muito, mas muito importante. Eu não
tinha ideia de como sobreviveria sem aquela dupla por perto.
-
Tudo bem, então. Vamos encerrar esse assunto e voltar à realidade – a Cá
decretou, ficando de pé com um pulo – O que me lembra que temos um Gueto para
limpar, meninas!
Respirei
aliviada por me ver livre daquele assunto. Depois do que a Mari falou, tudo
ficou ainda mais confuso na minha cabeça. Com muita dificuldade, consegui sair
do meu colchão e ir para o banheiro me arrumar. O sol brilhava com força no céu
e fazia um calor sufocante, típico da nossa cidade. Eu sentia como se tudo ao
meu redor estivesse rodando, e aquilo nada tinha a ver com ressaca. Era muita
informação para pouco eu.
Depois
de um café rápido, começamos a organização. E por mais que eu adorasse as
festas no Gueto, eu sempre odiava o dia seguinte. Era incrível como
conseguíamos fazer tanta bagunça em apenas uma noite!
Mas
era como dizia o velho ditado: tudo que é bom dura pouco. Logo, o jeito era encarar
a arrumação. Pelo menos aquilo me ajudaria a ficar longe dos meus outros problemas.
***
Os
pais da Carol voltaram no final da noite. Geralmente eles ficavam na casa da
praia durante todo o final de semana e só voltavam na segunda bem cedo. Porém,
dessa vez eles tinham um aniversário para ir, por isso precisaram subir a serra
mais cedo.
Com
a Cá sã e salva com sua família, aproveitei que o irmão mais velho da Mari foi
buscá-la para pegar uma carona até o meu condomínio. Como morava perto da
portaria, desci por ali mesmo para evitar o trabalho que eles teriam de
preencher um cadastro para entrar. O Alpes, onde eu morava, era o condomínio
mais caro e chique da cidade e, por isso, tinha um monte de regras de segurança
para visitantes. Essa parte era bem chata, mas de resto era tranquilo morar
ali. Essa era uma das poucas coisas que meu pai havia contribuído para a minha
vida. Como era um importante empresário que morava em Nova York, nós não tínhamos
muito contato. Tudo o que sabia era que ele trabalhava como um louco e que
pagava uma generosa pensão para minha mãe. E era toda essa “generosidade” que
mantinha alguns dos nossos confortos, como a casa e o carro. Aquilo era o
máximo de “pai presente” que tive durante toda a minha vida, incluindo algumas
ligações no Natal e aniversário.
Era
estranho, mas fazer aquele caminho para casa sempre me fazia pensar no quanto
minha vida poderia ser diferente se morasse com ele. Houve uma época que eu
temia que isso pudesse acontecer, que ele chegasse a pedir a minha guarda ou
coisa parecida, mas já fazia um tempo que eu torcia para que isso, de fato, virasse realidade. Sei lá, só queria que uma mágica ocorresse e PUF! Tudo mudasse...
-
Heeey Gabs! – ouvi alguém me chamar.
Virei
o rosto, na direção de onde vinha a voz e vi o Alê e o Edu vindo de skate, um
pouco mais atrás de mim. Estávamos na avenida principal do condomínio, que
circundava o lago localizado no centro do residencial. Já era quase e sete e
meia da noite, mas como era no horário de verão, o sol ainda estava se pondo.
Raios dourados iluminavam as águas escuras do lago e a copa das árvores que
margeavam a avenida, tingindo o cenário com uma luz especial.
-
Heeey! Estão dando um rolê? – perguntei enquanto esperava que se aproximassem.
-
Estou vendo se o Edu é mesmo tão bom no skate como ele diz – Alê disse quando
chegou até mim, estendendo a mão na sequência para tocar na minha mão.
-
Não disse que era bom no skate. Disse que sabia fazer algumas manobras, e só...
Meu negócio mesmo são as ondas – Edu se defendeu – E aí, Julieta? Procurando
seu Romeu? – disse ao se aproximar para me cumprimentar com dois beijos no
rosto, o que me fez ficar um pouco perdida novamente.
-
Mas não era Rapunzel?
-
Alexandre! – coloquei a mão na cintura, irritada.
-
Brincadeira, brincadeira! Eu sei que a apresentação será de Romeu e Julieta no
Teatro Municipal no dia do encerramento do Festival de Verão. A orquestra da
cidade vai tocar as músicas para vocês não, é? – ele se justificou enquanto
deslizava no seu skate fazendo pequenas manobras. Edu e eu caminhávamos ao seu
lado, sem pressa.
-
Nossa, vai rolar até orquestra? Caramba, o negócio será grande, hein? – o loiro
pareceu impressionado.
-
Sim! Como te disse, minha mãe faz parte da organização e desde o início eles
queriam algo grandioso. A ideia é inscrever a participação em grandes
festivais, como o de Campos do Jordão e circuitos em São Paulo – expliquei –
Por isso estou me dedicando tanto aos ensaios. Vai ser ótimo ter uma produção
desse porte no meu currículo...
-
E você já sabe o que vai fazer? Se vai mesmo estudar balé clássico? – Alê quis
saber.
-
Não... Continuo mais perdida do que antes. Sei lá... andei pensando em dar um
tempo e fazer um intercâmbio enquanto não escolho entre faculdade ou escola de
dança. Pelo menos posso aperfeiçoar meu inglês – contei ao virar a esquina da
nossa rua.
-
Seria uma boa, Gabs. Mas será que sua mãe concordaria? Você disse que ela está
te cobrando entre as duas primeiras opções – Alê opinou, ainda deslizando em
seu skate.
-
Na verdade, ela quer mesmo a escola de dança. A faculdade fui eu quem sugeriu –
estiquei a mão para pegar o boné que estava na sua cabeça e vesti-lo. Eu
adorava fazer isso só para ver o cabelo do Alê bagunçado. Ele era do tipo que
usava os fios mais compridinhos na parte de trás. Assim, com o acessório,
ficava superbacana e descolado. Mas quando tirávamos o boné...
-
Ahhh não, Gabi! Não faz isso! – ele protestou.
-
Precisa pentear esse cabelo, menino! Olha isso! Parece um ninho – baguncei
ainda mais seus fios, rindo alto.
-
Vai Gabs, devolve aqui. Preciso entrar! Combinamos de ajudar minha tia com
algumas coisas na casa nova, não é Edu? – ele pediu fazendo cara de emburrado.
-
É sim! Ela está querendo agilizar a mudança, mas tem alguns detalhes que
precisamos resolver antes. Tipo colocar algumas prateleiras, arrumar portas,
nada demais – o carioca se justificou. Eu ainda não havia me acostumado com o
seu sotaque carregado e achava engraçado ouvi-lo falando.
-
Uaaau, que garotos prendados! Sendo assim, vou para casa para não atrapalhar
essa organização familiar – zombei, tirando o boné e devolvendo para o dono.
-
Valeu, Gabi – ele agradeceu recolocando a peça na cabeça – E é sério, preciso
mesmo ir nessa. Depois a gente se fala mais, beleza?
-
Beleza, vai lá! E boa sorte na organização. Espero que dê tudo certo – me
despedi com um beijo no rosto e um rápido abraço – Tchau, Edu... – virei na
direção do loiro para me despedir, mas ele me impediu.
-
Te acompanho até sua casa. É nessa mesma rua, não é?
-
Sim, é aquela ali – apontei para o sobrado com janelas espelhadas e cortinas
claras – Mas não precisa, sério.
-
Relaxa, só quero saber como está o seu pé – ele mexeu nos cabelos, meio sem
jeito. Estava óbvio que ele queria saber sobre qualquer coisa, menos sobre a
situação do meu pé. Tão óbvio que o Alê se apressou para entrar, murmurando
alguma coisa sobre procurar uma chave de fenda, tudo para nos deixar a sós o mais
rápido possível.
De
repente ficamos sozinhos, a não ser pelo silêncio chato que tomou conta da
situação. Com um gesto rápido, ele apontou o caminho e então voltamos a caminhar,
um ao lado do outro.
-
E o seu pé? – ele puxou assunto.
-
Está ótimo. Não senti nada hoje pela manhã – contei.
-
Falei que minha massagem funcionava...
-
É, acho que preciso mesmo agradecer – dei um meio sorriso, olhando-o de lado.
-
Acho que o mínimo que mereço é um convite para assistir a apresentação – ele
provocou.
Balancei
a cabeça como se estivesse analisando a questão – Me parece justo... E de
qualquer forma, preciso de pessoas conhecidas na primeira fila para me
aplaudir, caso ninguém mais o faça... – emendei, parando em frente à minha
casa.
-
Se você dançar fazendo essa carinha de cachorro sem dono, duvido que alguém vá
resistir. Todo mundo vai aplaudir, nem que seja de pena – ele parou de frente
para mim, um pouco perto de mais para que eu conseguisse desviar o foco
daqueles olhos verdes tão intensos.
-
Poxa, esse foi um incentivo e tanto... Se já estava com medo antes, agora
então... – caprichei ainda mais na minha expressão de “garotinha indefesa”, só
para provocá-lo.
-
Não, calma! Não foi isso que eu quis dizer... – meu plano deu certo, porque ele
mexia as mãos, nervoso. Segurei firme a minha cara de triste, agradecendo
mentalmente às aulas de interpretação que fiz.
-
Olha, o que quis dizer é que independente do que faça no palco, as pessoas vão
aplaudir de qualquer jeito. Porque é preciso muita coragem para encarar uma
plateia disposta a fazer o seu melhor – ele colocou uma das suas mãos no meu
ombro, fazendo meu corpo estremecer de leve – E eu sei que você será a Julieta
mais linda que já existiu. Sorte de quem estiver lá para te assistir – ele
encostou a ponta dos dedos na minha bochecha, acariciando levemente.
Fechei
os olhos e me concentrei em apenas sentir. Primeiro o cheiro de roupa limpa que
vinha dele, depois o suave toque dos seus lábios passando pelos meus, o meu
coração disparado dentro do peito, sua outra mão na minha cintura até que, por
fim, ele me beijou.
_________________________________________
Notas finais: Geeeeeenteeeee, rolou beijo! Como assim, Braseeeeel?
A pergunta que não quer calar: Edu está afim da Gabi? Porque a Gabs está muito caidinha por ele, né?
E depois desse beijo, como serão as coisas? Contem o que acharam, ok?
Beijocas e ótima semana para todos!
Gente quanto amor!! Esse Edu ai não tá parecendo o original não kkkkk :P
ResponderExcluirMas melhor assim :D
beijos
Eu tinha que deixar o Edu mais "atrativo", né? Senão ninguém ia querer saber dele! hahah
ExcluirMas calma que um pouco mais para frente ele vai ficar mais próximo da realidade.
E já começou a ler, trate de se atualizar logo para me ajudar a criar os roteiros, tipo em "Una Canción". Vou amar ter uma editora. E ninguém melhor que você, né? Que faz parte da história, literalmente. hahahahaha