Notas iniciais: Oi pessoal, tudo bem? Capítulo de hoje está pra lá de caprichado! Como o título sugere, o grande dia chegou: é hora da Gabi subir ao palco e encarar o desafio da apresentação de balé!
Por conta das circunstâncias, o cap estava ficando enormeee! Só para vocês terem uma ideia, já estava com 14 páginas e ainda falta mais algumas "coisitichas" para escrever. Para agilizar, resolvi dividi-lo em duas partes.
Essa primeira está mais focada na apresentação e na relação da Gabs com a mãe. Na outra, vai rolar muito "Gadu" - como a leitora Kamis batizou o casal Gabi e Edu - para a alegria geral da nação!
Para entrar no clima de Romeu e Julieta, deixo aqui uma frase da história:
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A
semana passou voando. Quando pisquei o olho, já era sexta-feira! Como já era
esperado, passei todos os dias ensaiando, ensaiando e ensaiando... Com a
apresentação se aproximando, estávamos focados em acertar os últimos detalhes,
como as paradas para troca de figurino e cenário. Minha mãe não cansava de
repetir que o nosso objetivo era a perfeição e que ela não aceitaria nada menos
do que isso.
Apesar
da expectativa e das cobranças, um clima de ansiedade e confiança dominava
todos os integrantes do balé. Ao final de cada ensaio, sabíamos que estávamos
ainda mais preparados para encarar aquele desafio. Apesar das exigências, dona
Beatriz também sabia erguer a moral do grupo, elogiar os pontos positivos e nos
manter focados no objetivo.
Quando
não estava no palco, eu estava com o celular na mão trocando mensagens com o
Edu. Depois da nossa conversa de sábado não paramos mais de conversar.
Falávamos sobre as nossas rotinas, filmes prediletos, seriados e, principalmente,
sobre bobeiras do dia a dia. Ele adorava me provocar e eu sempre ficava
irritada, mas nunca ao ponto de realmente ficar chateada, nem nada do tipo. Eu
ousaria dizer que o Edu se tornara um grande amigo e companheiro se, lá no
fundo, não soubesse que ele significava muito mais do que isso. Meu pulso
acelerava a cada nova mensagem e sentia um nó na garganta quando demorava
demais para responder. O mais engraçado é que, mesmo com tanta intimidade, ele
nunca tocava no assunto de termos “ficado”. Por mais que eu tentasse falar
sobre isso ou tratá-lo de uma forma um pouco mais carinhosa, ele não retribuía
o gesto. De tanto ser tratado como amiga, acabei me conformado e segurando a
minha onda. Talvez fosse melhor mesmo ir devagar...
O mais complicado nessa situação era não ter
com quem desabafar as minhas dúvidas. Eu estava evitando falar com a Carol e a
Marília para evitar “puxões de orelha” e comentários do tipo “ele não quer ficar sério com ninguém”. Pelo
que percebi, elas estavam fazendo o mesmo. O nosso grupo do Whats andava
silencioso e os poucos comentários que apareceram durante a semana foram sobre
assuntos corriqueiros.
No sábado à tarde, ao chegar em casa após o
ensaio, me sentei no jardim para tomar um pouco de sol. Eu me sentia estranha e
queria um pouco de tempo para refletir, sem mais ninguém por perto. Tudo estava
muito diferente e era como se eu estivesse dividida: metade de mim estava
aflita e com medo da apresentação do dia seguinte. Ao mesmo tempo, a outra
metade sentia-se confiante e ansiosa para subir naquele palco e brilhar como
minha mãe dizia que seria.
O mesmo valia para o Edu: parte de mim queria
levantar naquele mesmo instante, ir até a casa do Alê e se jogar nos braços do
carioca sem medo nenhum de ser feliz. Porém, havia uma “vozinha” dentro de mim
que insistia em dizer que deveria ter cuidado.
Quando
o assunto era as minhas amizades, aí tudo ficava ainda mais complicado. Afinal,
se eram realmente minhas amigas, elas não deveriam ficar ao meu lado
independente de qualquer coisa? Ok, elas até poderiam estar certas sobre o Edu...
Mas por que me acusar ao invés de me proteger? Que tipo de amizade era esse que
me fazia ter medo de ser quem realmente sou quando estava perto delas?
Cansada, respirei fundo antes de levantar e ir
tomar banho. Eram muitas perguntas, todas sem respostas.
***
Enfim,
o grande dia chegou. Eu mal havia conseguido dormir à noite, tamanha era a
minha expectativa. Passei a madrugada inteira rolando na cama, tendo pesadelos
com toda a sorte de desastres que poderiam acontecer durante a apresentação:
cair no meio do palco, errar a coreografia, ser vaiada...
Quando
amanheceu, pulei da cama, aliviada por não precisar mais fingir que estava tudo
bem. Eu precisava de movimento, por isso fui até o jardim e passei a fazer
alongamentos. Minha mãe tomou um baita susto quando desceu para fazer o café e
me viu lá embaixo.
-
Gabriela, o que é isso? Vai descansar, menina! Ainda temos um longo dia pela
frente! – dona Beatriz chamou minha atenção passando pelas portas de vidro que
davam acesso à área de refeição que vinha antes do pequeno jardim.
-
Não consigo dormir, mãe! Não aguentava mais ficar rolando na cama tendo
pesadelos... – fiz bico parecendo uma garotinha mimada.
-
Ohh, minha filha... – ela veio até mim com os braços estendidos. Me aconcheguei
no seu abraço, sentindo o seu cheiro de sabonete – Não precisa ter medo! Vai
dar tudo certo! – seu tom de voz era carinhoso e reconfortante – Eu quero que
você saiba que tenho muito orgulho de você! Para mim é como se fosse uma
borboletinha... Te vi nascer, crescer, passar pela fase de lagartinha e por
todas as transformações possíveis até virar essa bela borboleta linda. Hoje é
seu dia voar, filhota! Vai abrir as asas e mostrar a todos a beleza, doçura e
encantamento que vivem dentro de você... – ela me apertou um pouco mais forte
antes de me soltar, segurar meu rosto com as mãos e dar um beijo suave na minha
testa – Tenho certeza que vai dar tudo! É hora de todo mundo conhecer o seu
talento.
Lágrimas
tomaram conta do meu rosto, a emoção me dominando por completo. Ouvir minha mãe
dizer que confiava em mim era o maior prêmio que eu poderia ouvir naquele dia.
Apesar da declaração aumentar ainda mais a minha responsabilidade, uma sensação
de tranquilidade e calma tomou conta de mim. Agora eu me sentia forte, capaz de
vencer qualquer obstáculo. Mesmo se caísse ou se errasse os passos, levantaria
a cabeça e seguiria em frente.
-
Vem cá, vou fazer um chá para você se acalmar – me puxando pelas mãos, ela me
levou até a cozinha, me colocou sentada em uma cadeira e se virou para começar
a mexer nos armários. Fiquei observando enquanto ela colocava uma chaleira no
fogo, separava os sachês de chá e separava as xícaras para nos servir. Poucos
minutos depois um líquido quente e com um cheiro agradável estava na minha
frente, acompanhado por alguns biscoitos integrais. Comi em silêncio,
aproveitando aquele clima gostoso de mãe e filha que pairava no ar.
-
Agora volta para cama e tenta relaxar um pouco – dona Beatriz pediu – Lá pela
hora do almoço te acordo para se preparar para a apresentação. Vamos mais cedo
para o teatro porque quero cuidar de todos os preparativos pessoalmente. Mas
por enquanto, descansa e guarda energia para a noite mais importante da sua
vida – ela piscou para mim de um jeito divertido e eu precisei me segurar para
não rir na sua frente. Que bicho tinha mordido aquela mulher?
***
Segui
o conselho da minha mãe e voltei para o quarto. Para minha surpresa, cai em um
sono tranquilo, sem sonhos – ou pesadelos. Só acordei depois do meio dia, com a
dona Beatriz me chamando.
Depois
de uma ducha revigorante e um almoço leve – mas com todas as vitaminas, fibras
e proteínas exatamente calculadas pela minha mãe – seguimos para o teatro.
Ainda teríamos um ensaio técnico antes de partir para a parte de maquiagem e
figurino. O objetivo era ter certeza que todos os procedimentos de troca de
figurino e cenário aconteceriam sem problemas ou atrasos. Essa logística era
fundamental para o bom andamento da peça. Um atraso sequer e tudo sairia do
lugar...
-
E aí, Gabs? Está tranquila? – o Miguel me cumprimentou assim que cheguei nos
bastidores. A agitação por ali era evidente. Todas as pessoas falavam ao mesmo
tempo, as vozes excitadas. O próprio Miguel, sempre calmo e centrado, mexia as
mãos de um jeito nervoso. Pelo jeito eu não era a única que não tinha dormido à
noite...
-
Claro! Tenho certeza que vai dar tudo certo! – Pisquei para ele, imitando o
gesto da minha mãe naquela manhã. Demonstrar nervosismo não adiantaria nada.
Nós erámos as principais personagens daquele balé e precisávamos estar bem para
que todos os outros seguissem o nosso exemplo.
-
É... você tem razão... – senti ele soltar o ar, aliviado. Depois me ofereceu um
meio sorriso como se estivesse se esforçando para acreditar em mim.
-
Vem, vamos lá repassar as pausas entre os atos antes que a dona Beatriz nos
mate – brinquei, puxando-o pela mão em direção ao palco.
Durante
os 60 minutos seguintes, passamos e repassamos cada detalhe do espetáculo,
ouvindo as ordens categóricas da minha mãe: ela não admitiria erros.
Ao
final do ensaio geral, ela reuniu todos no palco para uma última conversa –
Pessoal, hoje é o dia que vamos entrar para a história dessa cidade. Temos a
honra de celebrar a estreia desse belíssimo teatro com um espetáculo único,
jamais visto aqui na região. Sei que exigi muito de vocês e que fui chata
muitas vezes. Mas hoje, quando a música começar e vocês colocarem o pé no
palco, quero que cada um de vocês olhe para a plateia e pense: eu sou do
tamanho disso aqui. Eu tenho a musicalidade dessa orquestra, a força e beleza
de cada bailarino, a organização e o talento de cada membro da produção e sou
capaz de surpreender CA-DA PES-SO-A sentada nessas poltronas – ela enfatizou as
últimas palavras, a voz transbordando emoção – Por meses a dança nos moveu.
Hoje nós vamos fazer a dança mover toda essa cidade!
Um
grito entusiasmado surgiu entre os membros da companhia e os músicos - que
estavam posicionados na parte de cima do teatro, em uma espécie de balcão que
se projetava sobre as cadeiras da plateia – fizeram barulho com seus
instrumentos, juntando-se ao “grito de guerra”. Abraços e palavras de incentivo
surgiram por todos os cantos e, de repente, a atmosfera era de total confiança.
Naquele momento não tive como negar: minha mãe nasceu para fazer aquilo.
Após
alguns minutos de confraternização, o pessoal do figurino e da maquiagem
começou a convocar todos os bailarinos. Estávamos na contagem regressiva:
depois de prontos, seria a hora de subir no palco para valer! Só de pensar
nisso meu estômago dava loopings
completos dentro de mim. Se não morresse de expectativa, nada mais me abalaria
naquela vida.
As
cabeleireiras me sentaram em um local mais reservado e passaram a cuidar dos
meus cabelos. Já havíamos feito o meu penteado algumas vezes como teste, mas
agora elas pareciam estar ainda mais cuidadosas. Pegavam cada mecha como se
estivessem segurando cristais. Meu penteado consistia em tranças embutidas - que
se cruzavam no topo da minha cabeça como uma espécie de coroa - ornamentadas
por fitas douradas. Já a parte de trás variava. Para as primeiras cenas, os fios
estariam soltos, para dar “forma” a uma Julieta mais jovem e inocente. Ao longo
do espetáculo, conforme o balé tomasse “corpo” e assumisse a sua dramaticidade,
os cabelos seriam presos emuma espécie de coque. Embora achasse o penteado ultrapassado, não
tinha como negar que ele ajudava a vivenciar a personagem. As tranças traziam o
ar romântico da Roma antiga, dos tempos que o amor era tão forte e puro que os
jovens preferiam se matar a viver sem a pessoa amada. Eu me perguntava se um
dia seria capaz de amar daquele jeito...
Aliás,
falando em amor... Peguei meu celular pela primeira vez naquele dia. Havia
várias mensagens da Mari e da Carol, desejando sorte e avisando que estariam na
primeira fila para me ver. Fiquei feliz em saber que, mesmo enfrentando aquela
fase “estranha” de distanciamento, as duas não se esqueceram da apresentação. A
Carol nem tanto, mas a Marília sempre implicava com o meu ritmo intenso de
ensaios e a dieta balanceada. Eu torcia para que ela percebesse que tanto
esforço não era a toa. Tudo era em nome de um bem maior...
O
Alê também me mandou uma mensagem de aúdio, desejando “muita merda” e avisando
que, caso não aparecesse, era porque não tinha encontrado roupas à altura para
vestir. Não pude deixar de rir. O skatista sempre estava de boné, calça larga
caída na cintura, cueca à mostra... Realmente seria hilário se ele aparecesse
vestido desse jeito.
E,
por fim, tinha uma mensagem do Edu. Se meu coração já estava disparado antes,
agora ele pulsava no ritmo de uma bateria de escola de samba. “Gabi, estou aqui com o Alê caçando uma
roupa para vestir nesse tal balé. Tia Melissa está dando uma força. Aliás, ela
vai com a gente. Estaremos na primeira fila e vamos te aplaudir de pé. Porque
você merece, linda. Boa sorte!”.
Reli
a mensagem umas cinco vezes, no mínimo. Eram palavras bobas, mas para mim
significaram muito. Considerando o fato que o Edu não era muito de falar sobre
“assuntos sérios”, aquele já era um avanço e tanto...
Fiquei
contente em saber que todos viriam. Eu havia entregado pessoalmente os convites
para cada um deles – com exceção do Edu que recebeu sua entrada por intermédio
do primo – e disse que fazia questão da presença de cada um. Mesmo assim, temi
que eles achassem o balé muito chato, ou não aparecessem por pura implicância.
Guardando
o celular novamente na bolsa, pensei que talvez eu não precisasse ter dúvidas
em relação às minhas amigas, afinal. Provavelmente estava encanada a toa...
***
Ao
me olhar no espelho, não foi o meu reflexo que vi. O que enxerguei foi uma
perfeita Julieta, com um vestido amarelo de mangas longas decorado com babados
e bordados na região do busto. A saia seguia solta e fluída até o meio das
canelas. Fechavam a produção uma meia-calça branca, sapatilha combinando e
maquiagem bem leve.
Sem
que eu percebesse, Miguel se aproximou de mim e pousou a mão delicadamente
sobre o meu ombro – Nem parece que é de verdade! Às vezes acho que estou
sonhando... – disse, encarando nossa imagem no espelho. Ele vestia uma malha
branca, blusa clara com estampas que lembravam a época medieval e um colete em
um tom de verde claro com o mesmo tipo de estampa. De onde estávamos, eu
conseguia ouvir o barulho do público conversando enquanto esperava o início do
espetáculo. A expectativa crescia dentro de mim. Faltava menos de meia hora
para o início do balé, mas os minutos pareciam se arrastar.
***
Após
recebermos as últimas instruções da minha mãe, nos posicionamos em nossos
lugares. Pontualmente às 19 horas uma espécie de apresentador subiu ao palco
para falar sobre a apresentação e dizer algumas palavras sobre o encerramento
do Festival e a inauguração oficial teatro. O espaço estaria lotado de
autoridades, sem falar nos professores, críticos e coreógrafos de dança
clássica que vieram de outras cidades
para assistir a peça. Entre eles, um grupo de representantes da Companhia
Bolshoi do Brasil, considerada uma das melhores do país. Boatos que a companhia
abriria vagas para bailarinas no segundo semestre do ano deixou Dona Beatriz
empolgadíssima. Fazer parte daquele grupo era o mesmo que receber um
certificado de “bailarina acima dos padrões”. Volta e meia ela comentava sobre
o assunto, sempre deixando claro que se a oportunidade realmente surgisse, ela
faria de tudo para que eu fosse selecionada. Só de pensar no quanto precisaria
ensaiar para estar à altura do Bolshoi já sentia cansaço...
Por
fim, as luzes foram posicionadas e a cortina estava prestes a ser aberta. Lá em
cima, a orquestra estava pronta, apenas aguardando o sinal da minha mãe.
-
Meus queridos, essa é a nossa hora! Brilhem, minhas pequenas estrelas! – dona
Beatriz disse a todos com a voz cheia de energia e determinação. Na sequência,
deu o sinal para que a cortina fosse aberta.
O
som da música encheu o ambiente e as luzes iluminaram o palco. Poucos segundos
depois, Miguel e seus companheiros de cena começaram a dançar, os olhos
brilhando e os sorrisos estampados no rosto.
Meu
coração disparou e senti minha respiração ficar rápida. As lágrimas ameaçaram
rolar pelo meu rosto, tamanha a emoção que tomou conta de mim. Era exatamente
como minha mãe havia dito: aquele era o nosso momento! Depois de tanto esforço,
era incrível ver o balé tomando forma.
Esperei
ansiosa pelo meu momento de entrar em ação. Da lateral do palco, dei uma
espiada no público e vi meus amigos, junto com a dona Melissa, entretidos com a
apresentação. Como prometido, eles estavam na primeira fila, Edu e Alê vestindo
camisas sociais. Ao lado deles, algumas pessoas checavam os libretos – material
impresso no qual estava a descrição de cada cena, explicando o que estava
acontecendo na história. No total, a apresentação seria dividida em três atos e
treze cenas. Além destas informações, havia avisos extras, como o tempo de
intervalo entre um ato e outro, uma breve introdução sobre balés de repertório,
detalhes da trilha sonora, entre outros. Embora não fosse comum que informações
desse tipo constassem em libretos de balé, a organização achou que seria útil,
uma vez que a maioria do público não costumava frequentar espetáculos daquele
tipo. A ideia era “desmistificar a dança clássica” e torná-la o mais simples
possível.
Enfim,
a cena inicial da briga entre Capuletos e os Montéquio no mercado acabou e a
cortina se fechou para a troca de cenário. No geral, a maioria das cenas teria
como fundo uma grande escada ladeada por dois grandes corrimões dourados que davam
acesso a dois balcões laterais. Para as demais partes, seriam usados painéis
decorados de acordo com o decorrer da história.
Enquanto
o pessoal da produção corria para montar o cenário do quarto da Julieta, o
Miguel saía de cena. Ele estava suado e com o rosto vermelho, mas os olhos
exibiam uma satisfação contagiante.
-
Vai que é sua, Gabi! – ele estendeu a mão para tocar na minha enquanto
caminhava para os bastidores.
Sorri
em resposta, a adrenalina correndo solta pelo meu corpo. Novamente ao sinal da
minha mãe, a música voltou a tocar, as cortinas foram reabertas e era o meu
momento. Fechei os olhos e quando reabri, realmente me senti como a Julieta.
Entrei
no palco com a alegria estampada no rosto, não só porque a cena exigia, mas
porque era o que de fato sentia naquele momento. Todo o medo, ansiedade, os
pesadelos... tudo desapareceu da minha mente. Só o que ficou foi a frase que
minha mãe dissera aquela manhã: “abra as
asas e mostre a todos a beleza, doçura e encantamento que vivem dentro de
você”.
A
cada cena, passo e movimento esse sentimento foi se tornando mais e mais forte
dentro de mim. Toda a vez que eu olhava para o público e via as expressões
alegres ou tristes era como se estivesse marcando um ponto a mais no placar.
Tudo fluía naturalmente, sem esforço. Eu só precisava me deixar levar pela
história e deixar que as emoções transparecem através dos meus movimentos: a
primeira vez que encontrei o Romeu na festa dos Capuleto, o nosso amor à
primeira vista, a clássica cena do balcão quando os dois confessam seus
sentimentos, o casamento escondido na capela, a recusa do casamento com Paris e
o pedido desesperado de ajuda ao frei, o plano de se fingir de morta para fugir
com o amado até a fatídica cena da morte dos apaixonados.
Na
cena final, quando Julieta usa o punhal para se matar, era quase possível ouvir
o público segurando a respiração, tensos com o triste final do casal.
Quando,
por fim, Julieta caiu no palco sem vida e as luzes se apagaram, o teatro
explodiu em aplausos, assovios e gritos de bravo. Ainda sem me mexer, abri os
olhos e dei de cara com o Miguel me encarando, lágrimas de alegria escorrendo
pelos olhos. Mesmo sem falar uma palavra, eu sabia que ele partilhava da mesma
emoção que eu: nós havíamos conseguido!
Caraca,
tinha dado certo!
Me
levantei, ainda sem acreditar. Tudo parecia um sonho... Posicionando-se ao meu
lado, meu parceiro me puxou para um abraço, agradecendo sem parar pela bela
apresentação. Juntos, começamos a pular e girar em uma comemoração muito louca.
Foi preciso alguém da produção nos puxar para os bastidores para que voltássemos
ao normal.
Tudo
aconteceu muito rápido. Eu só queria ficar ali e curtir o sentimento de vitória
, mas minha mãe gritou para que todos voltassem ao palco para o clássico
cumprimento ao público. Rapidamente todos os bailarinos posicionaram-se um ao
lado do outro e, juntos, nos curvamos em agradecimento. Em troca, recebemos
mais uma salva de palmas, dessa vez de pé.
Fui
tomada por diferentes sentimentos naquele momento: sensação de dever cumprido,
orgulho, felicidade e uma vontade louca de descer e abraçar cada uma daquelas
pessoas, de contar como todo o processo foi difícil e longo, mas que a
apresentação foi fácil e tranquila. Ao olhar para o lado, vi minha mãe sorrindo
como uma criança, os olhos cheios de lágrimas. Sorri mais ainda, se é que isso
era possível. Ela parecia uma garota que acabara de ganhar um vestido novo.
Olhando para frente, vi os meus amigos também de pé, gritando como loucos. Dona
Melissa lançava exclamações de “linda” e me mandava beijos empolgados. Mari,
Carol e Alê brandiam os braços para cima, em sinal de vitória. E o Edu apenas
aplaudia com um sorriso no rosto. Quando nossos olhares se cruzaram, ele piscou
para mim e só aquele simples gesto me fez estremecer. Ahh, aqueles olhos
verdes...
Aos
poucos, todos foram deixando o palco, mas a animação continuava nos bastidores.
Assim que tiramos o figurino, minha mãe puxou eu e o Miguel para um verdadeiro
abraço de “urso”.
-
Vocês foram perfeitos! Perfeitos! – ela disse enquanto distribuía beijos nos
nossos cabelos, testas e bochechas. Nunca vi minha mãe tão emotiva e carinhosa!
Deveríamos fazer mais balés como aquele. A recompensa valia a pena...
Dona
Beatriz só nos soltou porque os outros integrantes da produção e do elenco
faziam fila atrás da gente exigindo uma chance para nos cumprimentar.
Contrariada, ela se afastou, apenas o suficiente que as pessoas se aproximassem
para um abraço. Ela parecia uma galinha “chocando” seus ovos, o orgulho
escorrendo pelos poros...
Acho
que nunca fui tão abraçada, beijada e parabenizada na minha vida... Já estava
começando a ficar entediada quando vi, no final da fila, algo que me animou muito:
o Alê, acompanhado pela mãe e pelo primo. Dona Melissa foi direto falar com a Dona
Beatriz, enquanto os meninos esperavam pela sua vez para falar comigo.
-
E aêêê, Julieta! Arrasou, hein? Aquela cena de você morrendo foi digna de Oscar
– meu amigo disse antes de me abraçar forte, me levantando do chão.
-
Alê, para com isso! Me põe no chão, seu louco! – bati de leve nas suas costas,
rindo do reação exagerada.
-
Minha mãe enrolou os seguranças dizendo que tinha uma passagem para Alemanha
marcada para hoje e que precisava falar com você de qualquer jeito antes de
embarcar – ele contou depois de me soltar. Ao ouvir isso, dona Melissa piscou
para nós de um jeito brincalhão. - A Carol e a Mari estão esperando lá fora,
eles não deixaram as duas entrarem. Mas parece que vai rolar Festa no Gueto
para comemorar o sucesso da apresentação. Tá podendo hein, dona Gabriela? –
emendou, tirando uma com a minha cara.
-
Opa, festa para mim? Desse jeito vou começar a me sentir importante – fingi
cara de espanto.
-
Mas acho que a ocasião merece uma comemoração especial – Edu entrou no assunto
– Aliás, parabéns – me deu um forte abraço, seu cheiro de roupa limpa trazendo
uma sensação gostosa de conforto. Antes de me soltar, ele fez um carinho de
leve nos meus cabelos e me deu um beijo na bochecha. Senti meu rosto ficando
vermelho e um sorriso bobo brotar nos meus lábios.
- É, acho que o carioca tem razão... – consegui dizer depois de voltar ao normal
– Eu topo a comemoração no Gueto. Só preciso ir para casa tomar um banho, tirar
essa maquiagem e desmanchar esse cabelo.
-
Mas por que? Vai seduzir todos os gatinhos da cidade com esse visual de Julieta
– Alê me zuou – Está tão sexy...
-
Gabi, você não está com o seu celular? – o loiro perguntou.
-
Não, ele ficou na minha bolsa junto com as minhas coisas. Por quê?
-
Nada não, nada não... – ele se apressou em dizer em tom enigmático.
Troquei
um olhar com o Alê para tentar entender a pergunta, mas ele apenas deu de
ombros - Então, fechou! Vamos indo na frente com as meninas para agilizar o
esquema. Te esperamos no Gueto, beleza? – o skatista mudou de assunto.
Acertamos
mais alguns detalhes e eles partiram, não antes da dona Melissa me dar um
abraço apertado e me dizer que eu parecia um anjo no palco. Agradeci, contente
pelas palavras, e ela apertou a minha mão antes de sair.
Sorri
sozinha, encarando o trio e agradecendo por ter uma família tão maravilhosa
como vizinha.
***
Depois
de cumprimentar alguns amigos da minha mãe, pedi a ela que me deixasse ir
embora para comemorar com meus amigos. Ela estava tão feliz que me deixou ir
sem nem dizer algum aviso do tipo “olha a dieta!” e “não vai comer demais,
hein?”. Peguei dinheiro para o táxi, a minha mala e voei para fora do teatro.
Como Guararema era uma cidade pequena e todo mundo conhecia todo mundo, não
havia perigo nenhum. Todos os motoristas da cidade costumavam ser muito gentis.
Embora
o movimento fora do teatro estivesse grande, não foi difícil arrumar um táxi
disponível para me levar. Indiquei o meu destino e me sentei confortavelmente
enquanto o motorista regulava o taxímetro. Durante o percurso, cacei meu
celular na bolsa. O que não faltavam eram notificações de mensagens e
comentários nas redes sociais. Mas claro que ignorei tudo ao ver que havia
mensagens não lidas do Edu no Whats...
“O que acha de uma comemoração especial
depois da apresentação?”
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Notas finais: Huuum... Comemoração especial? É isso mesmo, Brasil? E aí, alguma sugestão de como os dois poderiam comemorar? hahaha
Beijocas e obrigada por ler! Volto semana que vem no mesmo bat horário e no mesmo bat local! =)
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Oiieeee.... xD
Espero que esteja curtindo a fic!
Se estiver, não deixe de "perder uns minutinhos" para me contar a sua opinião, registrar o seu surto ou apenas para dar um oi! E se não estiver curtindo, aproveite o espaço para "soltar o verbo" e falar o que te desagradou!
Uma história não existe sem leitores! São vocês que me dão forças para continuar escrevendo e caprichando cada vez mais em cada capítulo! Portanto, deixe de "corpo mole" e venha "prosear" sobre as fics comigo e com as outras meninas que passam por aqui! *-*
Cada comentário ilumina muito o meu dia! Não deixe de fazer uma quase-escritora feliz: Comente! *-*
E não esqueça de deixar o seu nome, ok?!